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29.2.12

Em seus trabalhos: Mitos e Verdades no Processo de Adoção e Filhos Adotivos e Rendimento Escolar, Lídia Weber consubstancia históricos, resultados de pesquisas e depoimentos para uma discussão reflexiva sobre os mitos, medos e preconceitos ainda tão presentes no processo de adoção no Brasil e no mundo. Especialista dessa temática, pontua, com muita propriedade, o quanto necessitamos pesquisar e estudar sobre o assunto.

Em todos os tempos e em todas as civilizações existiram, e continuam existindo, pessoas que têm um grande desejo de ter filhos e pessoas que não querem, ou não podem, criar seus filhos. Dentre aquelas que têm desejo de ter filhos, uma parte significativa não pode tê-los, e, dentre todas as crianças, existem muitas que ficam sem pais. Portanto, a organização social das mais diferentes culturas encontrou maneiras de estabelecer diferentes tipos de relações familiares que não as biológicas. O objetivo principal seria proteger a criança, embora nem sempre tenha sido desta forma. Existe, porém, um fim mais subjetivo para aqueles que são pais: fazer sua inscrição na história, criar suas raízes e supor uma fuga da finitude. O objetivo de um filho será sempre, de uma certa maneira, a própria sobrevivência.

A adoção é uma realidade biológica e, ao mesmo tempo, uma realidade social, que está marcada pelo sobrenome. O sobrenome é a indicação e o reconhecimento social de que pertencemos a uma família. O nome é dado, mas o sobrenome é transmitido. Da mesma forma, a adoção está inserida numa realidade psicológica e afetiva: a filiação significa pertencer a uma história, a um passado, ligar-se por raízes a uma criança. Para os pais, a adoção significa ter um filho.

Apesar da adoção ser uma prática antiga, a falta de estudos científicos sobre o tema no Brasil fez com que a adoção permanecesse sendo tratada de forma preconceituosa, alimentando fantasias e mitos. Esses estereótipos em relação à adoção advêm da mídia e do boca-a-boca, que generalizam casos mal sucedidos de adoção, e também pela generalização de casos clínicos dramáticos, que colocam a perda inicial dos pais biológicos como irreparável para a criança adotada e determinante de todos os problemas da adoção. Forma-se, desta maneira, uma representação limitada e errônea em relação à adoção e, principalmente, em relação aos filhos adotivos, vistos como crianças problemáticas, revoltadas, ingratas com quem lhes acolheu, incapazes de superar o “trauma” do seu abandono e fadadas a repetir comportamentos, supostamente inadequados, de seus pais biológicos (o medo da hereditariedade desconhecida da criança).

Desta forma, a associação dos mitos, da falta de esclarecimento e a valorização dos “laços de sangue” fazem com que, ainda no Brasil, a “adoção” tenha o significado de um “sintoma”. Esse significado vem tanto das pessoas em geral, quanto dos psicólogos, psiquiatras, professores e também dos pais adotivos. A população brasileira ainda fala “baixinho” sobre adoção. Terrel e Modell (1994) argumentam que muitas pessoas na sociedade ocidental pensam que a adoção é a segunda melhor maneira de constituir uma família, mas devem saber que outras pessoas, em diferentes partes do mundo, podem ver a adoção de diversas maneiras, que não se parecem com o viés ocidental de parentesco. O tratamento da adoção na literatura antropológica mostra que o conceito é tido como não-problemático, no entanto, a doação de crianças pode ser analisada como um dos aspectos de parentesco, uma forma de solidariedade social ou uma resposta a condições demográficas.

No Brasil, o início da investigação sobre adoção é muito recente. Santos (1988) realizou um estudo comparativo entre um grupo de pais e filhos adotivos e outro de pais e filhos biológicos para avaliar aspectos como afetividade e cooperação entre pais e filhos. Não encontrou diferenças significativas entre eles.

Realizei a primeira pesquisa com uma boa amostragem de famílias adotivas (Weber, 1996), verificando que, sob a óptica dos pais e filhos adotivos, as relações entre eles são plenamente satisfatórias. Levando em conta as dificuldades escolares, elas são compatíveis com aquelas que ocorrem em famílias biológicas.

Entretanto, as pesquisas européias e, especialmente, americanas sobre os diversos aspectos da adoção, são numerosas e, boa parte delas, indica que existe um excesso de distúrbios de adaptação em crianças adotivas, se comparadas com a população em geral. Em uma revisão sobre o tema, Hersov (1990) apresenta oito fatores que poderiam explicar essa situação:
1. Fatores biológicos e sociais relacionados com a gravidez e a experiência pré-natal de crianças vindas de lares desfavorecidos;
2. Experiências anteriores à colocação final da criança na família adotiva, incluindo casas de passagem ou famílias de apoio, com novas perdas de figuras de apego;
3. Interferência na formação de vínculos na primeira infância com os posteriores efeitos na personalidade e relacionamentos;
4. Adoção realizada depois de viver a infância em instituições;
5. O estigma social que envolve a adoção;
6. Problemas de identidade na adolescência provenientes da confusão ou desconhecimento de suas origens;
7. Riscos de fatores genéticos que predispõem à psicopatologias; e
8. Dificuldades provenientes do processo de “revelação” podem afetar relação familiar.

Um belo estudo espanhol (Palacios e Sánchez, 1996) realizou uma extensa investigação comparativa com 865 crianças entre 4 e 16 anos de idade, procedentes de quatro grupos: adotadas, companheiras das adotadas, crianças das mesma zonas de origem das adotadas e crianças institucionalizadas. As comparações foram realizadas em três áreas: problemas de comportamento, auto-estima e rendimento acadêmico. Os resultados mostraram uma grande semelhança entre os adotados e seus companheiros atuais, as crianças institucionalizadas obtiveram os piores resultados no conjunto das comparações.

Na verdade, as respostas que temos até o momento não são conclusivas em relação à adaptação geral da criança adotada, embora seja possível tirar algumas breves conclusões:

* Os problemas emocionais e escolares, apresentados por adotados e não adotados, dependem de uma multiplicidade de fatores que interagem em conjunto e, desta forma, é metodologicamente complicado o isolamento de cada uma das variáveis de interesse, como por exemplo: herança genética, cuidados pré-natais, reações à separação da mãe biológica, nível social e econômico dos pais adotivos, cuidados maternais recebidos antes da adoção, número e qualidade dos locais de acolhimento prévios à adoção, idade em que ocorreu a adoção, atitudes dos pais adotivos em relação à infertilidade, preconceitos e estereótipos sociais, cultura e país de origem da criança adotada etc;

* A motivação para a adoção tem tido pouca importância para o sucesso da relação, como mostram estudos realizados no Brasil (Weber, 1996, 1997), indicam ainda que a natureza da adoção (legal ou ilegal) não tem influência sobre a dinâmica familiar e os problemas ocorridos nela e no rendimento escolar acontecem muito mais por causa de uma variável importante, que é a revelação tardia, inadequada ou feita por terceiros da adoção para a criança;

* Os estudos sobre o tema revelam que ainda precisamos de muitas pesquisas para tentar entender as condições de apego em famílias adotivas, mas a simples condição de “adotado” não deve mais ser um sinônimo de “sintoma” ou de “doença”, pois este não é um fator que determina o destino social, pessoal ou acadêmico de um indivíduo; e

* Os pais adotivos mostram-se muito exigentes e pressionados socialmente pela sua função “adotiva” e tendem a encaminhar seus filhos a profissionais especializados com maior freqüência do que pais não adotivos. Pais adotivos, assim como profissionais da saúde mental e da educação, estão, juntamente com o restante da população, sob a influência dos preconceitos que ainda existem na questão da adoção e percebem-na como um fator de risco natural.

Parece que o mais importante é uma dinâmica familiar na qual exista compreensão, capacidade de tolerância e de doação para com o outro e isto independe da família ser adotiva ou não. Em um ambiente escolar deve-se entender a adoção como um outro tipo de parentalidade e filiação, tão importante e com a mesma essência quanto a biológica, e não como um fator de risco. A questão da adoção no Brasil é bastante interessante, pois nós temos uma espécie de “laboratório natural” que mostra o quanto a construção de laços afetivos é poderosa e repleta de variáveis ainda desconhecidas.

Enquanto os técnicos dos Serviços de Adoção do Poder Judiciário no Brasil tentam criar condições perfeitas (encontrar candidatos perfeitos para bebês perfeitos), a maioria das adoções em meu país é classificada como “inadequada” pela maioria dos profissionais da área da psicologia, são adoções singulares: baseadas em mentiras (registrar uma criança como filho biológico); a motivação mais freqüente é egoísta, ou seja, é a satisfação de um desejo de maternidade; a preparação dos adotantes e das crianças é praticamente inexistente; entre outros aspectos desfavoráveis.

No entanto, pesquisas recentes (Weber, 1996, 1997) mostram que as famílias adotivas brasileiras estão bem! Parece que a existência de uma experiência emocional poderosa tem a capacidade de atenuar essas “inadequações” de todo o processo. Vale a pena estudar e pesquisar cada vez mais sobre o tema. Nessa época atual, não podemos mais contar com verdades absolutas e precisamos duvidar de argumentos dogmáticos e transformar as respostas em novas questões!

texto indicado pela Cris, tirado daqui

18.5.07

Comentando sobre a revelação

Estou terminando de ler o livro Pais e filhos por adoção no Brasil da Lidia Weber e há uns trechos bem interessantes sobre a revelação. Achei melhor abrir um novo post em vez de comentar no texto da Cláu, assim todos podem ler mais facilmente.

"Os depoimentos de filhos adotivos mostram que a 'revelação' tem compreensão diferente em diferentes estágios do seu desenvolvimentoo, e portanto, A HISTÓRIA DA ADOÇÃO DEVE SER CONTADA EM DIVERSOS MOMENTOS, EM DIFERENTES IDADES DA CRIANÇA, mas quanto mais cedo isso ocorrer, mais facilmente será incorporado como uma situação 'natural' e não um tipo de transgressão à ordem (biológica e cultural) vigente. Um depoimento de uma mãe adotiva, feito em um congresso da área, revelou essa falta de conhecimento da adoção e processo de desenvolvimento de uma criança: ' Eu não sei o que fazer com a minha filha. Hoje ela tem 15 anos e está muito revoltada porque é adotada. Eu contei para ela, quando ela tinha 5 anos, mas ela esqueceu!'"

"Para Neuburger, é injusto e inexato dizer para uma criança que ela É uma criança 'adotada', pois isso qualifica uma natureza particular de ligações que a obrigará a uma eterna obrigação de justificar o seu comportamento por uma conduta diferente, pois não é uma criança como as outras. Toda criança, qualquer que seja o modo de procriação, entra em uma família por um ato civil. Em vez de rotular a criança com uma criança adotada, é lícito e legítimo ensinar-lhe que ELA ENTROU NESSA FAMÍLIA POR ADOÇÃO, família esta que, por vezes, foi constituída com a sua chegada. Neste sentido, a contingência que permitiu sua entrada na família foi a adoção, mas agora essa criança é tão filha (o) dos seus pais adotivos quanto as crianças que entraram em uma família através da procriação."

"Não apenas o revelar, mas O QUÊ FALAR PARA O FILHO SOBRE A ADOÇÃO TAMBÉM É EXTREMAMENTE IMPORTANTE. Melina afirma que não se deve falar que a 'criança foi escolhida'. Isso pode levar a criança a pensar que se ela foi escolhida, um enorme contingente de outras crianças foi deixado de lado, e essa é uma imagem impossível de conviver, pois leva ao pensamento de que se ele foi escolhido é porque ele é perfeito e ele não seria escolhido se tivesse mostrado alguma imperfeição. Na verdade, parece que é preciso aproximar-se o máximo possível da situação real e da motivação para a adoção e afirmar que não somente a criança estava em uma situação difícil: os pais também estavam porque queriam muito um filho que não conseguiam ter. Esse ponto de vista, especial para pais adotivos inférteis, faz com que eles não fiquem sempre com a imagem de salvadores da criança e os filhos, com a gratidão eterna..."

23.4.07


UMA REFLEXÃO SOBRE O PRECONCEITO ATRÁS DA PALAVRA



In: Weber, L.N.D. (1998). Laços de ternura: pesquisas e histórias de adoção. Curitiba: Santa Mônica, p. 114.
...Isso é o aprendizado. De súbito você compreende algo que havia percebido a vida inteira, mas de maneira nova (Doris Lessing)

Em nosso dia-a-dia costumamos utilizar muitas expressões e termos que denotam preconceito sem que tenhamos plena consciência disso. Assim, as novelas, os meios de comunicação de massa e as propagandas estão repletas de chavões preconceituosos, muitas vezes mascarados em sátiras e situações engraçadas, as quais servem simplesmente para manter um determinado status quo que um segmento social acha recomendável. Rimos da mocinha "bonita e burra" de determinado programa de televisão e não percebemos o quanto isto é estereotipado e preconceituoso. Ouvimos e vemos, a todo momento, expressões que denotam preconceito racial, religioso, étnico, social, estético, e muitos outros. É preciso parar para refletir um pouco. Alguns termos transformam-se em diagnósticos de vida. Foi o que ocorreu com o termo "menor". Menores eram sempre os filhos dos outros, aqueles que estavam nas ruas, era a cultura menorizada. O nosso filho era sempre uma criança ou adolescente, mas o filho do outro, do menos favorecido, era um "menor". Tomando consciência desta fato, a sociedade aboliu o termo menor e passou a chamar todos os filhos de crianças e adolescentes, culminando com o fim do Código de Menores e com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Com os discursos e a literatura a respeito de famílias adotivas tem acontecido algo semelhante, onde percebe-se, por trás da semântica o preconceito, e que fazemos aqui uma moção para que isto seja modificado. Algumas pessoas perguntam para a mãe adotiva se "essa é a criança que ela pegou para criar"; se a família possui filhos biológicos e adotivos, as pessoas costumam apontar para um deles e perguntar: "é esse o seu"?; ou ainda, após saber da adoção, pessoas podem perguntar, mas "você conhece a mãe verdadeira dele?". Todas essas frases demonstram uma falta de esclarecimento associada ao preconceito em relação a esta constituição familiar.

De maneira geral, quando fala-se de família adotiva, utiliza-se como antítese "família verdadeira", "família natural", "família legítima". Temos por convicção e por força dos dados científicos, que a família adotiva não é artificial não, mas é tão verdadeira e legítima quanto a outra. Sua essência não é diferente, mas somente a contingência de como foi constituída. Então, sugerimos que sejam utilizados os termos família de sangue, família biológica ou família de origem em contraposição à família adotiva. Da mesma forma, quando fala-se em filho adotivo, a antítese mais comum é falar em "filho verdadeiro", "filho natural", "filho legítimo", "filho meu mesmo". Sugerimos que sejam utilizados os termos filho de sangue e filho biológico, pois o filho adotivo não é artificial, nem falso ou ilegítimo e é filho mesmo dos seus pais adotivos!

12.11.06

Aumento nas “devoluções” preocupa

Fonte:http://canais.ondarpc.com.br/viverbem/
Autora:ÉRIKA BUSANIerikab@gazetadopovo.com.br

Aumento nas “devoluções” preocupa
O recente aumento na aceitação de crianças maiores para adoção trouxe um problema que preocupa todos os envolvidos no processo, a “devolução” de crianças. “Do ponto de vista emocional a devolução é sentida pela criança como uma reafirmação do trauma da separação – ou rejeição – de sua mãe biológica. Nesses casos, um bloqueio no desenvolvimento psíquico, físico e cognitivo é inevitável”, alerta a psicóloga Sibele Miraglia, que adotou Fábio, 10 anos, há um ano.Mas o que acontece para alguém que se dispõe a passar por um processo, esperar algum tempo – mais curto quando as crianças são maiores – para simplesmente desistir? “Isso é uma sociedade que reproduz o mercado, a cultura do descartável”, afirma a psicóloga Barbara Snizek, que fez um trabalho de pós-graduação sobre adoção. “Para a criança, é catastrófico”, garante.Falta também preparo para esses pretendentes à adoção. “Ter um filho é também agüentar frustração. Entre o sonhado, o ideal, e o que a criança realmente é, há uma distância. Talvez na maioria dos casos não tenha a ver com ser adotado ou não, mas com o fato de que ninguém tem idéia do que é ter um filho”, diz Barbara.“A culpa também é nossa”, assume a psicóloga Andréa Trevisan Guedes Pereira, da Vara da Infância e Juventude – Adoção. “É um processo que está mudando, as pessoas aceitam crianças maiores e estamos fazendo o processo da mesma forma. Elas têm de ser melhor preparadas.”Os técnicos da Vara estão iniciando um projeto para ampliar o trabalho de pré-adoção, colhendo dados com quem já adotou para saber onde estão os problemas. “A idéia é passar a experiência de quem já viveu isso, como a criança costuma se comportar, como sua experiência da vida anterior influencia na adaptação”, conta a assistente social da Vara de Adoção, Salma Mancebo Corrêa.Em Curitiba, os pretendentes à adoção passam por um curso preparatório de três dias. “Enquanto em outros países os adotantes precisam passar por extensos cursos – no mínimo 6 meses – para compreender o processo que envolve uma família por adoção, no Brasil, a maioria dos Juizados nem dispõe de preparação, simplesmente seleciona”, indigna-se a doutora em psicologia Lidia Weber.Talvez falte mesmo para esses pretendentes compreender que a adoção é apenas um outro caminho para se ter um filho. Que, como qualquer criança, traz alegria, tristeza, emoção, dúvida, carinho, faz birra, se suja, desobedece, dá aquele abraço inesperado. É preciso estar aberto para recebê-lo.

27.4.06

ADOÇÕES TARDIAS: A HISTÓRIA ANTES DA HISTÓRIA

Os primeiros anos de vida são como os primeiros lances de uma partida de xadrez, eles indicam a orientação e o estilo de toda a partida, mas enquanto não se está em cheque-mate, restam ainda bonitos lances para jogar. (Anna Freud)


Muitas vezes, ao conversar com pessoas que tinham planos de adoção, perguntei se imaginavam adotar um bebê. Candidamente eles respondiam, "não, não é preciso que seja um recém-nascido; a criança pode ter até 6 meses". Pessoas que não podem gerar filhos biológicos, quase sempre imaginam adotar um bebê, para "poder cuidar desde pequenininho; dar mamadeira e trocar fraldas!" E, imaginam que uma criança "mais velha" seja um bebê de até três meses de idade....
Todos nós já sabemos que não é esse o perfil de crianças que necessitam de uma adoção, ou seja, a maioria das crianças que estão a espera de uma nova família são crianças com mais idade. Tecnicamente, considera-se uma adoção como "tardia" quando a criança tem idade acima de dois anos. A pesquisa de Weber e Kossobudzki (1996) mostrou que a maioria das crianças que são deixadas nas instituições tem mais de sete anos de idade.
Como conciliar o desejo e a história anterior dessas crianças com a desejo dos adotantes? Será que é possível e viável a adoção de crianças com mais idade, crianças que já têm uma história? De acordo com Andrei (1997), "quanto mais tardia a adoção, mais vivas serão as lembranças do passado e mais enraizadas na sua memória as ilusões, sonhos, desejos e frustrações dos anos de abandono". Andrei afirma que as pessoas imaginam esta adoção em termos ideais. De um lado, a criança adotada extremamente grata e com o coração transbordante de amor represado durante os anos de "solidão"; do outro lado, a família sentindo-se plenamente realizada e recompensada através do seu novo membro. Às vezes, é exatamente essa a situação que ocorre. Às vezes, "o fardo do passado influenciando o comportamento da criança e a surpresa da família diante de manifestações decepcionantes, tornam a adoção mais parecida com um desafio" (Andrei, 1997).
No entanto, as experiências mostram que não é verdade que todas as adoções de crianças maiores sejam problemáticas, mas elas apresentam características especiais, pois, sem dúvida, são diferentes das adoções de bebês.
A principal diferença é que essa criança já possui um passado. E, geralmente, é um passado que contém cicatrizes. De qualquer forma, existiu uma outra relação anterior na vida dessa criança ou adolescente, mesmo que tenha sido uma não-relação, como ocorre com a vida em instituições. A principal questão para os pais, talvez seja, se essa criança conseguirá amá-los e se eles conseguirão amá-la. Já foi dito que, de maneira geral, a criança tem a capacidade de estabelecer vínculos afetivos de maneira mais fácil que os adultos. As crianças mesmo institucionalizadas estão com o seu amor latente... Para compreender e amar esta criança, deve-se ter em mente que não é possível apagar a sua história anterior e, certamente, proporcionar oportunidades para a criança de expressar as suas dores e tristezas, ou até raiva e sentimentos de perda. O maior medo de uma criança adotada tardiamente é "ser devolvida", é "voltar novamente para a instituição". Às vezes, essa criança pode ter tanto medo, que em vez de mostrar amor, ela pode fazer tudo ao contrário, pois de maneira não consciente ela pensa: "eu vou ser abandonada novamente, então é melhor não gostar deles".
Alguns depoimentos de filhos adotados com mais de seis anos de idade mostram sentimentos de medo e confusão: "Foi como se a minha vida tivesse virado de cabeça para baixo"; "Foi dramático, chocante, eram duas realidades bem diferentes"; "Eu fiquei assustada"; "Fiquei confusa, tive bastante medo".
Os pais adotivos devem estar preparados para estas reações, até mesmo certa hostilidade inicial, e serem tolerantes em relação a novos hábitos, costumes e sistemas de valores que a criança traz consigo. (...)
Na pesquisa que realizei com filhos adotivos, daqueles que foram adotados com mais de 6 anos, a maioria absoluta revelou que suas vidas melhoraram (93%): "Foi como ganhar na loto"; "Foi infinitamente melhor"; "Fui bem alimentada e pude estudar; "Tive maior estabilidade no emprego; meus pais incentivaram o diálogo"; "Tive pai e mãe".
Parece que, na adoção tardia, os pais devem ter uma capacidade grande de empatia, ou seja, de entender aquela história anterior do seu filho e devem ser também uma espécie de ancoradouro para que a criança ou o adolescente sinta que pode contar essa história, desabafar e até ter raiva dela. A capacidade de qualquer relacionamento familiar, de fato, parece não depender da história anterior dos protagonistas, da aparência física ou da idade, mas da verdadeira capacidade de construir o afeto, com base em trocas e doações.

Texto retirado de:Weber, L.N.D. (1998). Laços de ternura: pesquisas e histórias de adoção. Curitiba: Santa Mônica.