18.5.08

A VERDADEIRA MATERNIDADE

Sou mãe de dois filhos adotivos e me irrito quando dizem que eles não são meus "filhos verdadeiros".
 
VOCÊ TEM TODA A RAZÃO de se irritar. Um doador de esperma, por acaso, é um pai "verdadeiro" ou é um simples masturbador de material genético? É claro que você vê orgulho nos pais biológicos que também desempenharam a paternidade. Seus filhos têm seus traços, seus trejeitos, suas heranças biológicas. Eles são pequenas miniaturas deles.
A mãe natureza quer esse vínculo, para o benefício das crias. A tolerância de pais biológicos para um "sangue ruim", que a loteria genética lhes produza, será maior do que a de pais adotivos.
Mas, afinal, o que são um pai e uma mãe "verdadeiros"? São aqueles que produzem as condições para que a criança se torne uma pessoa, um indivíduo. São aqueles que desempenharam funções de pai e de mãe (continuação do ventre é igual a nutrição; calor e proteção, função de mãe; apresentação suave para viver no mundo, função de pai). Todas podem ser desempenhadas pela pessoa, quem quer que seja, interessada na criança: mãe, pai, babás, avós, curadores de orfanatos etc.
Quando um embrião se torna um ser humano (desenvolve um sistema nervoso que o permite sentir alguma coisa), vai precisar dessas funções para se tornar uma pessoa. É um trabalho danado, um investimento amoroso enorme. A "verdade" está com quem toma para si tal empreendimento.

(texto escrito por Francisco Daudt, psicanalista, publicado na Revista da Folha em 27/04/08)

2.5.08

Neste artigo, a juíza Mônica Labuto fala sobre a adoção, tema que segundo ela: “é permeado por dúvidas, mitos e preconceitos”, esclarecendo alguns pontos que ainda não foram bem digeridos pela sociedade. De forma clara, a juíza explica como ocorrem as adoções e a importância de ter certeza na hora de adotar uma criança, informações que estão na cartilha lançada este ano em meio às comemorações do Dia Nacional da Adoção.


Ao ensejo das comemorações do Dia Nacional da Adoção – 25 de maio –, data reconhecida oficialmente em 07/05/2002, com a promulgação da Lei n° 10.447, de autoria do deputado catarinense João Matos, cumpre-nos traçar um panorama do relevante instituto jurídico que busca, em sua síntese, assegurar o direito de crianças e adolescentes à convivência familiar quando desassistidas por suas famílias de origem, envolvendo também questões psicológicas e sociais, dando um contorno maior do que simplesmente uma instituição jurídica, positivada em texto legal vigente.
O ato de adotar, muito mais do que uma instituição jurídica definida e regulada por lei, é a construção de uma família, sendo que “o que os pais adotivos fazem, na verdade, é transformar ‘crianças’ em ‘filhos’, reinventam a família, tornando a família adotiva, uma família inventada pela cultura e pelos afetos”, nas sábias palavras de Fernando Freire.
O tema adoção é permeado por dúvidas, mitos e preconceitos, que devem ser destacados e devidamente esclarecidos a fim de promover uma sólida reflexão sobre a realidade do ato de adotar, sendo certo que um dos aspectos é a preocupação de muitos com a questão da herança biológica na determinação do comportamento, o medo da revelação da condição de adotado, o receio quanto à adaptação de crianças nas adoções tardias, dúvidas quanto à adoção monoparental e por homossexuais, entre outros que integram as relações humanas.
Com o objetivo precípuo de esclarecer e desmistificar as questões pertinentes à adoção, o Fórum de Paracambi, por meio de seu Setor Técnico, organizado por esta magistrada, elaborou uma cartilha como ponto de partida ao processo de reflexão do instituto junto à população, abrangendo as dúvidas mais comuns, a legislação que rege a matéria, de forma clara e acessível, devendo-se gizar que apenas a informação não muda conceitos ou comportamentos, sendo necessário o uso de outros instrumentos que possibilitem a abran-gência que merece o tema, como, por exemplo, os Grupos de Apoio à Adoção, que são grupos formados por pais e filhos adotivos e outros interessados, que se reúnem buscando trocar experiências, refletir e discutir sobre a questão, oferecendo também esclarecimentos de forma continuada, nas várias etapas dessa vivência humana.
Cumpre-se salientar que, lamentavelmente, nem todas as comarcas contam com essa importante iniciativa, carecendo tais munícipes de mais informações e apoio acerca do tema adoção, trabalho realizado pelos Grupos de Apoio que também visam informar, divulgar e incentivar a adoção por vias legais.
Uma das conseqüências jurídicas mais importantes do processo de adoção é a perda do pátrio-poder pelos pais biológicos que, com isso, perdem todos os direitos e deveres que eventualmente teriam sobre o filho que restou adotado, dando aos pais adotivos, a contrario sensu, aqueles direitos a eles pertencentes, passando o adotado a ter, até, outro registro de nascimento, com os nomes dos pais adotantes, sendo vedada qualquer menção à adoção na nova certidão do adotado.
Deve-se salientar que em quaisquer relações humanas há conflitos e problemas de relacionamento decorrentes do convívio diário, sejam em uma família com filhos biológicos ou adotivos, devendo ser afastadas as observações do tipo “agiu assim por ser filho adotivo...”, o que é um erro gravíssimo, tendo em vista que o filho biológico também pode gerar conflitos e sofrer crises decorrentes das várias etapas do desenvolvimento, não se devendo creditar ao fato de ser adotado a ocorrência de problemas de convívio no relacionamento cotidiano.
Finalmente, muito ainda há para falar sobre tema tão amplo como a adoção, mas o certo é que ainda há um longo caminho a trilhar, buscando dirimir dúvidas e quebrar tabus que ainda recaem sobre o ato de adotar, que é, acima de tudo, um ato de amor, um momento de construção de uma família por meio de laços de afeto.